Duas mãos enormes e calejadas se juntam para segurar amêndoas de cacau ainda envolvidas na polpa branca e viscosa do fruto. A imagem, de estética impactante, era uma das muitas na exposição do fotógrafo sergipano Lailson Santos que recepcionava, logo à entrada, quem visitou a 25ª edição do Salão do Chocolate de Paris na semana passada.
Com uma média de até 130 mil visitantes por dia, que tornaram corredores intransitáveis, o evento reuniu produtores e marcas de chocolate – de minúsculas a gigantes do mundo inteiro – de 30 de outubro a 3 de novembro. Entre os estandes, origens de cacau das mais variadas: Brasil,Tanzânia, Havaí, Colômbia, Vietnã, Fiji, Gana.
Em cerca de 60 m², o estande do Brasil foi pouso fixo para a Missão Empresarial que levou a Paris cerca de 40 profissionais de diversos Estados, entre pequenas e médias marcas de chocolate, como Cacau do Céu e Natucoa (BA), Da Cruz e Nayah (PA), além de sulistas como Nugali (SC) e Negro Doce (RS). E ainda produtores e representantes de órgãos que ajudaram a colocar a Missão de pé, como Confederação Nacional da Indústria (CNI), Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab), Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac) e os governos da Bahia e do Pará.
Para além de vender barrinhas no estande, o desafio da Missão era proporcionar visitas técnicas e workshops para ajudar empreendedores brasileiros a entender o mercado europeu e a projetar a internacionalização de seus negócios.
“Para exportar, a empresa tem de ser bem gerida, ter produto com competitividade e conhecer as regras do país. Mas isso não é só para exportar, ela precisa disso para sobreviver em meio aos concorrentes no próprio Brasil. Se chega uma empresa chinesa no País, ele precisa saber competir”, pontua Patrícia Orrico, gerente do Centro de Internacionalização de Negócios (CIN) da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb).
Uma das articuladoras da Missão Empresarial, Patrícia conta que, nos outros anos de participação no Salão, o Brasil esteve representado com dois estandes – um dos órgãos da indústria, outro dos governos da Bahia e do Pará. Pela primeira vez, os esforços conjuntos levaram a um estande só – grande e vistoso, cujo luminoso com o nome do Brasil podia ser visto de longe em meio ao pavilhão em Porte de Versailles.
“A cada ano que participamos, a evolução é clara, mas a concorrência também. Por isso, temos ainda muito a conquistar”, afirma o empresário Marco Lessa, coordenador do estande brasileiro em Paris há 11 anos e idealizador do Chocolat Festival no Brasil, com edições em Bahia, Pará e São Paulo.
Entre as atividades preparadas para a comitiva, o turismo foi tema transversal, como lembrado por secretários estaduais da Bahia e do Pará em palestra na Embaixada do Brasil na França para integrantes do trade. A ideia, ao espelho de como acontece na França, é poder aliar a venda do destino com os produtos cacau e chocolate.
É aí que entra a expertise francesa. Por valorizar o produto exclusivo (artesanal) e o trabalho do artesão (savoir faire), a França é conhecida no mundo por suas denominações de origem, que protegem patrimônios e atraem consumidores do mundo inteiro. Como pontuou Patrícia Orrico, é o chamado marketing territorial.
Rodadas de negócios
Além das visitas técnicas, rodadas de negócios compuseram a agenda da Missão Empresarial. Um dos encontros envolveu produtores e representantes de Brasil, Venezuela, Peru, México, Equador, Colômbia e República Dominicana.
“Discutimos a necessidade de haver um intercâmbio maior entre esses países, para troca de tecnologia e processos. A outra questão foi a participação em eventos, para integrar mais os produtores e poder tratar a região como bloco”, conta Marco Lessa, segundo quem também foi aventada a possibilidade de a América Latina se reunir num prêmio regional antes da final mundial no Salão do Chocolate.
O prêmio Cocoa of Excellence, realizado há dez anos, há pouco tempo passou a ser bienal. A ideia seria fazer um evento latino no ano em que não é realizada a etapa global. Neste ano, para a 10ª edição da premiação, foram selecionados 50 finalistas de todas as regiões produtoras de cacau. O foco é o cacau fino – que representa apenas cerca de 1% da produção mundial.
Pelo Brasil, estavam o baiano João Tavares Neto (único brasileiro que já ganhou duas vezes) e as irmãs Elcy e Eunice Gutzeit, do Pará. Mesmo não tendo levado desta vez prêmio para casa, os produtores ganharam visibilidade por estar entre os finalistas e aproveitaram para fazer negócio com marcas francesas.
Segundo Eunice Gutzeit, entre as marcas interessadas em suas amêndoas estão as francesas Bonnat e Chapon, de chocolate ao estilo artesanal “bean to bar” (que usa cacau fino e se distingue da indústria em processo e qualidade).
Com nome mais consolidado no mercado europeu, João Tavares vende há anos para o chef multiestrelado Alain Ducasse – a barra Brésil 75% é a única com cacau brasileiro na coleção de origens do cozinheiro francês.
* A jornalista viajou a convite da Missão Empresarial do Brasil